Wednesday, March 16, 2011

Sem título 2




Sem título 2


Não sei que te diga.

Se morri, se sobrevivi

a diferença neste momento parece demasiado exígua

para suscitar sequer algumas lágrimas

ou um ligeiro esgar de solidão

que denunciaria a sobrevivência

por isso não sei

se fosse grande já estaria noutro lugar

quiçá noutro tempo

num dia de outro lugar

num sítio de outro tempo

espectros vacilantes

e ousadias mudas

não conferem mais verdade

nem mais vitalidade

a certidão está certa

certifica o certo, certifica só

os pavoneamentos têm de ficar para outra altura

as máscaras de tristeza são uma outra história

e as estrelas vão-se e vêm

verdadeiros troféus de luz

da luz eterna

do amor

do desdém de todo este asco!

oh, eu peço para partir

ou para ficar amparado por ti

embalado no meu mar, no teu marejar

cabelos revoltos como ondas que rebentam, antes de espraiar

na minha queda não implico ninguém

a dor é demasiada e a sanidade já não é muita

temos dor por cima das cabeças e não damos conta

dor por cima da pele, espalhada como manteiga

dor nos olhos, dor nos olhos

e uma tristeza ainda maior do que a solidão

entre os dedos trémulos

do destino

da força

do fado, que é um fado desgraçadinho

corridinho e escorridinho

manipular a matriz afinal não é tão fácil como apregoam

os vendedores de banha da cobra

e de felicidade alheia

que não lhes pertence

que não lhes é nada

nada de nada

assim, só resta o resto

e o resto é tudo

somos nós

sou eu e eu

e ainda eu

e eu

Na verdade está a força

na luz o apoio

na paciência o cenário de todas as vidas

dos milhares de anos à espera

de ti

quem sabe

quem não sabe

a maior parte não nos deixam

não nos deixam saber

sinto inúmeros cheiros, sabores, ideias e sentimentos simultaneamente

eu não devia ser eus

devia ser nil

porque o nada é tudo

e o pouco é muito

e o coração vazio está na verdade cheio

a casa vazia afinal cheia

a imensidão que a vista alcança

afinal é fértil de todas as oportunidades

de ser senhor, de ser árvore ou pedra

de ser algo que nos encha de orgulho

ou céu ou nuvem ou asas de condor

que são grandes e importantes

quem se importa com as asas dos rouxinóis?

Só com o seu canto, evidentemente

e a nossa força está no mar

na potência infinita da tormenta e do abandono

virtudes chuvidas dos céus

e malaguetas do destino

oh, apetece mesmo ir a correr pelos teus olhos a dentro

e perdermo-nos lá

lá longe de nós, longe de tudo

longe do longe

na pátria está a virtude

no igreja a maravilha

é preciso morrer para se viver

morrer para viver? Estão doidos, diz outra vez a voz

eu cá vou é ser o napoleão dos meus netos

e desfraldar as velas da disputa

nos mastros do alpendre

imperador do alpendre, que rico título

que rico apodrecer

tão lento, tão lento

que até dá sede

sede de beber água e vinho e mel

alcool cruel, traidor infame

porque fazes isso às criancinhas?

Hoje as nuvens acastelam-se de novo

para assistir ao morrer do dia

ao nascer duma lua tão lua como nunca tiveram

ao nascer dum luar demasiado

demasiado

demasiado para mim

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